20050901

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FACES 

Um cego acaricia a face de alguém, para o identificar, através de um movimento descendente pela cara. Faz este gesto, contornando com os dedos, as covas do rosto e as cavidades oculares; tocando ao de leve no nariz, na testa, na pele, com um cuidado com tanto de ternurento como de necessário.

Os dedos sorriem por esse gentil passar pelas pálpebras e pelas sobrancelhas, pelos olhos semicerrados e pelos lábios semi-húmidos, pela terminação do queixo e pelas faces que se percepcionam levemente rosadas.
Imaginas-me neste ritual entre as minhas mãos e a tua face?
Mas eu alio a este processo o funcionamento total da minha visão, a acompanhar esse tactear doce e prolongado. Porque quer-se demorado esse sentir. Posso então olhar-te com sedução e tocar-te de modo apaixonado, simultaneamente.
Posso eu, os meus dedos, brincar com o teu cabelo?
Fechar-te devagar e propositadamente o olho com um qualquer indicador?
Contornar-te os lábios e cruzá-los com os dedos?
Desenhar círculos imaginários sobre a tua face?
Pentear-te as sobrancelhas numa carícia intencional?
Percorrer percursos e criar trajectos inexistentes na tua cara?
Emprestar-te por momentos os meus digitais para te fazer sorrir?

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